Sem Festival da Eurovisão este ano, resta o filme Eurovision Song Contest: The Story of Fire Saga para os fãs do evento musical europeu. O filme já está disponível na Netflix e conta com Will Ferrell, Rachel McAdams, Pierce Brosnan, Dan Stevens e até Salvador Sobral.
Crítica feita por: Bernardo Freire (Visão de um Crítico)
A peste do Covid-19 tem cancelado todos os eventos de renome em 2020, incluindo o tão celebrado Festival Eurovisão da Canção. Com o intuito de mitigar a ausência do concurso e de distribuir gargalhadas necessárias pelo mundo fora, o realizador David Dobkin oferece uma versão do festival intitulada Eurovision Song Contest: The Story of Fire Saga. Distribuída pela Netflix, a comédia musical promete demasiado e oferece ninharias em termos de graça e engenho narrativo, ainda que consiga reter a atenção numa ou outra atuação.
Escrito por Will Ferrell em colaboração com Andrew Seele, o argumento conta a história de Lars Erickssong (Ferrell) e Sigrit Ericksdottir (Rachel McAdams), dois músicos islandeses que desde cedo estão enamorados pelo Festival da Canção. Inspirados pela música dos ABBA, os sonhadores formaram o grupo Fire Saga e desejam levá-lo a representar o seu país no Festival. Graças a uma série de acontecimentos bizarros e – talvez – à boa fortuna concedida por elfos islandeses misteriosos, conseguem a sua oportunidade para brilhar.
Não sendo um ávido consumidor do evento anual, quando os atores estão em palco e os números musicais estão a decorrer, The Story of Fire Saga capta aquilo que pode muito bem apelar às milhares de pessoas que seguem o concurso com rigor. Apesar dos Fire Saga envergonharem a sua cidade natal, Húsavík, o filme realça simultâneamente a partilha entre povos e culturas, assim como o patriotismo inerente dos concorrentes. Por vários desméritos e momentos tontos que tenha, a obra proporciona algum entretenimento e aplaude a coesão geográfica, algo absolutamente necessário nos dias que correm. No limite, afirmo que quanto mais gostarem do Festival, mais facilmente conseguem abraçar a extravagância da obra e deixar passar os seus aspetos sintéticos.
Dito isto, para uma comédia que excede as duas horas de duração, os risos estão muito pouco presentes. Will Ferrell continua a sua onda de personagens acriançadas e muito embora aqui esteja um pouco mais moderado volta a não suceder no humor físico. Por outro lado, McAdams tem uma entrega doce e consegue ser uma presença charmosa no ecrã mesmo quando o papel não lhe dá muitas asas para voar. Já que falei em charme, seria impossível não saudar a interpretação de Dan Stevens no apetitoso papel de Alexander Lemtov, o Leão Russo, que é o favorito a ganhar a competição. Em conjunto com o dueto principal, Stevens completa um triângulo amoroso que acaba por ser completamente redundante quando os créditos finais começam a rolar.
Também mal amanhada está a relação entre Lars e o seu pai, Erick (Pierce Brosnan), que representa o expoente máximo da humilhação que a pequena cidade sente pelos músicos. É uma conexão plástica que desenvolve de forma pouco orgânica e culmina sem brio. O que acaba por espelhar aquilo que The Story of Fire Saga emana: uma tremenda artificialidade. Isto é, as interações entre as personagens são funcionais ao ponto de moverem a narrativa em frente, mas nunca genuínas o suficiente para me fazer preocupar com as respetivas jornadas – quer emocionais como situacionais.
O guarda-roupa está muito bem preparado, os cenários procuram envolver e nota-se o carinho que a produção tem pelo Festival. Características importantes, mas postiças, perante a voz desafinada do filme.