O mercado de inverno encerrou na passada terça-feira. No compto geral, foi um mercado de transferências bastante aquém do esperado e com muito poucas surpresas, isto na arena do futebol europeu. No reino azul, os ventos sopraram com mais intensidade do que no resto da europa, fazendo as muralhas do Restelo abanar como há muito não se via.
Comecemos pelos factos. O Belenenses perdeu 9 jogadores e foi buscar 7. Os dados são factuais e tirando Mário Palmeira e Luís Silva, todos os restantes jogadores eram preponderantes na equipa azul. Joel Pereira, jovem guarda-redes português, estava emprestado pelo Manchester United e as suas boas exibições fizeram com que voltasse à ‘casa mãe’. O guardião foi peça-chave nos jogos que efectuou pelo Belenenses, mas o seu regresso a Old Trafford não causou muita estranheza. Continuando a senda de jogadores cruciais, temos João Palhinha. O médio, 21 anos, fez 18 jogos com a Cruz de Cristo ao peito e era o homem forte do meio-campo. Tal como foi apanágio do Sporting neste mercado de inverno, o clube de Alvalade fez retornar os jovens emprestados. Palhinha foi um deles. Estes dois jogadores foram baixas de peso e acabaram por sair sem que o Belenenses tivesse uma palavra a dizer.
Aí está um dos problemas dos emprestados. Além de se valorizar activos de outros em detrimento do produto interno, há uma subjugação aos interesses do ‘clube-mãe’ que impedem que se possa usufruir ao máximo do jogador. Os emprestados são um dos maiores cancros do futebol português. A subserviência prestada e o, muitas vezes parco, contributo dado por jogadores de outros clubes, faz com que seja insustentável preparar um futuro estável com uma equipa recheada de jogadores de outros, que estão ansiosos por sair, vendo a equipa onde estão como um mero trampolim. Esse é cada vez mais um problema das instituições que dizem querer crescer. Os compadrios consentidos, as jogadas de bastidores e, mais uma vez, a subserviência que existe, acabam por não contribuir em nada para quem sobrevive à custa de emprestados. Quem lucra sempre são os empregadores que cedem activos para os ver crescer e valorizar. Uma estratégia legítima, mas que não tem o mesmo peso positivo para ambos os lados.
Além dos regressos aos clubes de origem de Palhinha e Joel Pereira, o Belenenses perdeu mais 3 jogadores importantes. Gerso, que rumou aos Estados Unidos por, supostamente, 1,5 milhões de euros; Fábio Sturgeon, que tendo uma cláusula de 7,5 milhões e sendo apontado por muitos como o maior activo do clube saiu por 500 mil euros para o V. Guimarães e Gonçalo Brandão, um homem da casa que, pese embora tenha já deixado passar os melhores anos enquanto jogador, era a alma do plantel e a âncora emocional da equipa. Tirando Gerso, que era de facto preponderante, todos os outros não tinham um peso futebolístico equiparável ao do guineense. O grande problema é mesmo a vertente financeira, que foi, uma vez mais, defraudada.
Para colmatar as saídas sonantes, numa altura que devia ser de pequenos ajustes e não de uma revolução total, o Belenenses trouxe jogadores que havia dispensado no…verão. Caso insólito, mas que terá por certo alguma explicação não conhecida. Fábio Nunes, Filipe Mendes e Juanto Ortuño. Três jogadores que se desvincularam há menos de 6 meses e que estão de volta para tentar equilibrar a equipa. O jogador que terá mais oportunidades acabará por ser o espanhol, não a jogar como homem mais adiantado – posição na qual não se adapta no modelo de Quim Machado -, mas para ser o segundo avançado que o treinador precisa.
Não se ficaram por aqui as contratações. Maurides, Persson, Diogo Viana, Cristiano e Edgar Ié são os nomes restantes. Maurides vem para tentar fazer o que nunca conseguiu em Arouca, ou seja, afirmar-se. Será o concorrente directo ao lugar que é de Camará e não se prevê que Andric ou Betinho – que não contam para a equação – lhe possam dar luta. Contudo, Tiago Caeiro deveria sempre ser o primeiro da lista. Tempo será o que Maurides precisa, mas tempo é o que há menos a partir de janeiro. Uma incógnita que pode ser uma agradável surpresa. Persson, 29 anos, é um experiente médio para uma posição na qual o Belenenses está muito carenciado. O sueco assumirá as despesas defensivas e de pêndulo do meio-campo, algo que nem Vítor Gomes, nem Yebda estão talhados para fazer. A adaptação ao futebol português também não será imediata e a necessidade de que Robert Persson assuma logo o lugar, pode resultar numa pressão pouco positiva. Crisitano assumirá a baliza azul. Os poucos jogos que realizou nos últimos anos poderão ser vistos como um ponto negativo na vinda do jogador. No entanto, só a regularidade exibicional pode ser positiva para o guardião. Edgar Ié, 22 anos, é outro jogador com pouco tempo de jogo e sem rotinas a jogar a lateral, posição onde alinhou no último encontro, visto ser central (também actua nos corredores, mas raramente). O ex-Sporting que passou os últimos anos nas equipas B do Villareal e do Barcelona tem agora a primeira experiência a sério numa exigente 1.ª Liga, esperemos que a tenra idade e a falta de experiência não se notem quando o internacional pelas camadas jovens portuguesas for chamado a jogo. Por enquanto não será o titular. Diogo Viana é a grande contratação deste defeso. O extremo tem qualidades reconhecidas e será um substituto mais do que à altura de Fábio Sturgeon e terá um nível parecido ao de Gerso. Ter vindo em definitivo e com ‘fome de bola’ são aspectos que servirão de motivação ao ex-CSKA Sofia para realizar uma boa segunda metade da época. O plantel azul estava muito carenciado de extremos e as características de Diogo Viana encaixam que nem uma luva no modelo de jogo de Quim Machado.
Em suma, foi um mercado atípico para uma equipa que procura estabilidade. As 15 movimentações num mês são demasiado. Sobretudo se considerarmos que a época vai a meio e que a consistência é o que mais se procura. Muitas saídas mal explicadas e entradas algo duvidosas. Oxalá o timoneiro azul consiga extrair o melhor das várias qualidades de ovos que tem e faça uma omelete grande e com selo de qualidade.