O cartão branco, dedicado ao reconhecimento do fair-play, chegou ao futebol feminino. Saiba mais sobre este desenvolvimento positivo no futebol português.
O cartão branco é um interessante e curioso desenvolvimento no futebol que aumenta as odds de que o desporto possa ser encarado de forma mais justa, beneficiando o espetáculo e toda a sua circunstância. Criado em 2015 e destinado às camadas jovens, o cartão branco é mostrado pelo árbitro quando um jogador demonstra uma atitude de fair-play. Tal como os cartões amarelo e vermelho, mas neste caso como um “aviso” positivo, e não negativo — uma recompensa.
A iniciativa já se estendeu ao futebol feminino, tendo o primeiro cartão branco sido mostrado num jogo onde, curiosamente, não foram lançadas odds por parte das casas de apostas nacionais. Isso tendo em conta que a legislação só permite apostas desportivas no futebol feminino se os jogos se tratarem do campeonato nacional. O jogo em questão contou para a Taça de Portugal, foi disputado no dia 21 de janeiro e opôs os dois “colossos” do futebol feminino nacional, SL Benfica e Sporting CP. A árbitra Catarina Santos recompensou ambas as equipas com o cartão branco após as respetivas equipas médicas socorrerem um espectador que se sentira mal, nas bancadas.
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Especialmente importante nas camadas de formação
O Diário de Notícias, em artigo de 2020, dá-nos um exemplo do que motivou a exibição deste cartão. Num Benfica-Sporting em futsal (categoria Benjamins), com o marcador ainda a zeros, o árbitro assinalou penálti quando um benfiquista cortou a bola com a mão na grande área.
Jogos de formação não entram nas bancas de apostas; se fosse um jogo profissional, quem estivesse a apostar ao vivo correria a tentar apostar num golo sportinguista antes que as odds mudassem. Mas um jogador sportinguista corrigiu o árbitro — o corte havia sido com a cara e não com a mão. O árbitro corrigiu a decisão e premiou o jovem leonino com o cartão branco.
Se tal acontecesse em jogos profissionais e grandes campeonatos, como a Champions League, os apostadores passariam a ter de contar com o historial de fair-play de determinada equipa no momento de calcularem odds e elaborar prognósticos!
E o facto é que no meio de tantas notícias, nos últimos anos, sobre o caráter estranhamente agreste e agressivo do futebol juvenil, dada a quantidade de pais que sonham em ser a próxima dona Dolores Aveiro, trata-se de uma novidade refrescante. Não se trata de tornar o futebol assético, mas conferir-lhe mais civilidade. Acima de tudo, mais justo e com mais cartões brancos onde as odds apontam para um jogo mais agradável de ver para o espectador.
O futuro estará nos próprios adeptos
Quais as odds de um episódio semelhante ao do citado Benfica-Sporting em benjamins acontecer num jogo profissional, perguntar-nos-emos? Muito baixas. Tendo em conta o discurso dominante, as odds são de que um profissional que se arriscasse a fazê-lo poderia até ser penalizado pela sua própria massa adepta, tal é o grau de irracionalismo a que se assiste em termos de discurso nos últimos anos. “O fair-play é uma treta”, disse Jorge Jesus, mas a verdade é que um treinador que não faça tudo, mas tudo, para vencer, é penalizado pelos adeptos que exigem vitórias. As vozes que se levantaram contra Sérgio Conceição, no seio do FC Porto, pelo seu comportamento durante a Supertaça 2023, foram raras.
Júlio César e Ricardo, ex-jogadores do Benfica e Sporting, fizeram um apelo contra a violência no futebol. Mas, se os adeptos, do mais anónimo às figuras públicas em torno dos clubes, não exigirem o mesmo, como poderão os treinadores e jogadores adotá-lo? As odds de tal são escassas.
Naturalmente que o fenómeno é extensível aos restantes clubes, sendo especialmente intenso e notório nos “Três Grandes” devido à sua dimensão. Os adeptos até podem pensar racionalmente ao procurar odds vantajosas quando se registam e jogam em apostas desportivas, mas quando pensam como adeptos a ordem é vencer, sem olhar a meios.
Porém, dirigentes, profissionais e até mesmo as federações, como a FPF, têm de se mentalizar que estamos no século XXI e que o século XX, “o século das massas”, já acabou. As opções de entretenimento e o grau de atenção dão ao futebol muitos concorrentes sob a forma de videojogos, filmes, música, etc. Quais são as odds de um desporto gerido sistematicamente recorrendo à batota e deslealdade se manter relevante, junto das gerações mais jovens e do futuro?